Felicidade

Viajar  com meu filho é um exercício de revisão de vida. Ele puxa lá de baixo, do fundo do bau, acontecimentos, perdas, faltas, coisas que deveriam acontecer e não aconteceram, que deveriam ter sido e não foram. Em meio a isso vai falando do tanto que tem de trabalho, do tanto que anda ocupado, de como dormiu pouco e comeu mal. E questiona, por que isso, por que aquilo. Por que não faço isso ou aquilo, que deveria ter mudado de profissão, que eu poderia ter sido qualquer coisa que quisesse, que poderia ter ganho muito dinheiro, ufa! Fala e critica ao mesmo tempo. E eu, sem conseguir processar tudo o que ele diz, todas as ideias que tem, todas as queixas e colocações, fico meio embasbacada, respondendo com monossílabos tipo "sim, mano" ou "é verdade", "tem razão". Um dia desses, quando fomos para Porto Alegre para comprar um gps (localização; uma grande dificuldade minha e dele)e assistir uma peça de teatro, ele foi me bombardeando. De repente disse que eu estava muito quieta, que não falava (e ele deixa?) e lascou a pergunta: "mãe, tu é feliz assim com a tua vida?" Eu creio que respondi que sim, sou feliz. Mas não disse porque sou feliz. E depois do resto daquele dia e daquela noite, que aconteceram muitas outras coisas, entre elas que ele não conseguiu comprar o gps e nos perdemos em Porto Alegre e não conseguimos assistir o teatro porque não reservamos ingresso e não tinha mais, eu parei pra pensar na sua pergunta: sou feliz? e, mais, o que é felicidade?
Pensei sobre isso e descobri (eu sempre soube) que a felicidade para mim não é um pacote fechado que vem prontinho, colocado na nossa porta por um remetente desconhecido e do qual tiramos uma coisa somente. Quando meus filhos eram pequenos e estavam todos em casa, era felicidade para mim quando eu deitava na cama e sabia, tinha certeza, que todos estavam em suas caminhas,com seus pijaminhos limpinhos e cheirosos. Que no outro dia de manhã eles acordariam e estariam todos ali. Quando, no sábado, depois de uma semana de trabalho fora de casa e essa casa fosse ficando bem bagunçada, eu levantasse cedo, arrumasse, varresse, lavasse, limpasse, deixasse tudo limpinho e organizado, flores no vaso, janelas abertas, sol entrando. Aí, eu fazia um chimarrão, pegava um livro ou uma revista, colocava música clássica a rodar no som e sentava na área, pensando na vida, em como tudo estava bom assim, cada coisa no seu lugar. Felicidade para mim era quando tinha uma apresentação na escola, no dia das mães e até mesmo no dias pais, porque era eu quem ia. Quando recebia bilhetinhos de amor deles. Quando aprendiam uma palavra nova, quando olhava nos olhos deles cheios de esperança e expectativas para o futuro. Quando me abraçavam forte e diziam eu te amo. Isso era felicidade para mim e eu era feliz. Hoje, depois de todos adultos e fora de casa, sou feliz quando os encontro, os abraço, beijo. Quando dizem que me amam. Quando admiram meu trabalho,minhas fotos. Sou feliz quando conversamos, trocamos ideias, falamos do passado, contamos e rimos sempre das mesmas histórias.
Felicidade, para mim, é ter meus filhos, saber que eles existem, que são seres humanos. É isso.

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