quando a gente quebra a mão

quebrar a mão é uma coisa muito chata. primeiro a gente sobe num banquinho e ainda fica na ponta do pé pra alcançar a lata de biscoitos açucarados que a mãe da gente fez e guardou lá em cima no lugar mais alto pra criança nao alcançar. e aí a gente escorrega, cai e bate a perna, e a bunda, ea cabeça, e dói, e a gente tenta pegar o ar e se agarrar em tudo e não consegue se agarrar em nada. e cai em cima do braço e em cima da mão. e o barulhão? a lata de biscoitos vem abaixo e é biscoito pra todo lado, e açúcar no cabelo, e nas pernas e nos joelhos. e a gente grita, ai,ai,ai. e e tem alguém em casa todo mundo corre e a mãe diz, ai meu deus do céu que guria mais arteira, assim eu nao aguento. deixa eu ver se machucou, levanta! e se a gente está sozinha dá uma dor maior, muito maior, e muito medo. será que quebrou alguma coisa? e a gente tenta levantar e nao consegue, e fica tonta e tudo gira. A cabeça dói, e o braço dói e a mão fica torta e a gente não consegue mexer. Depois de ficar um tempinho deitada esperando não sei o que, a gente levanta e pega o telefone e liga pra alguém e pede socorro caí, acho que quebrei o braço. precisa de ajuda? quem está falando? sou eu. eu quem?aí a gente vê que ligou pro número errado e nem sabe com quem está falando. então a gente olha e procura o número certo e liga pra pessoa nos socorrer. não pra mãe porque a gente não quer que ela se preocupe nem que descubra que tentamos roubar os biscoitos açucarados que ela fez pras visitas. aí a amiga vem e nos leva pro hospital e a gente preenche ficha e entra numa sala e fica esperando o médico. A enfermeira vem e pergunta de que lado quer a injeção, no braço a gente responde e ela nao ouve e diz pra baixar a calcinha e finca a agulha e pergunta se doeu e o médico vem, e não olha pra nossa cara e pergunta se dói e onde dói e aperta e pergunta aqui? aqui? e aí dói mais,muito mais, e ele diz pra fazer um raio x e a gente senta perto daquela máquina,numa sala escura e a moça não pára de falar e vai atrás de uma cerquinha e aperta um botão e a gente ouve um barulho e de novo, e vira a mão, e de novo. e vai olhar se ficou bom, e volta, e de novo. e a mão incha mais e dói mais e a gente tem vontade de chorar,mas fica com vergonha,nao tem ninguém ali pra nos consolar e então a gente não choro.o médico olha o raio x e diz que tem fratura e o outro olha e diz que foi o rádio. quebrou o rádio, melhor ele diz, poderia ter sido a tv.nao acho graça porque meu rádio dói e minha perna dói muito,mas a gente não quer levantar a saia e mostrar a perna pro médico,então não diz que dói. ele pede uma tala pra enfermeira e a gente pensa se a tala é a mulher do tal.e enrola,e aperta e enrola e aperta. e diz que quando desinchar é pra engessar e dáremédio para o caso de doer de madrugada e nos manda pra casa.a gente vai e tem que contar pra mãe e ela xinga, e ajuda a tirar a roupa e colocar o pijama, e nos deita, dá beijo na testa e balança a cabeça e diz que poderia ter sido pior, e aí a gente deita e dá uma tristeza tão grande e uma vontade imensa,muito maior do que a gente de chorar. e agora a gente escreve só com uma mão e tudo é muito mais difícil.e assim é quebrar a mão.

Comentários

Postagens mais visitadas