Meus dias de Cinema Paradiso

Nos anos setenta tive meus dias de Cinema Paradiso. Eu tinha quatorze anos em 1974 e minha amiga Isabel Santa Catharina e eu íamos ao Cine Guarany,  em Caxias do Sul, onde o tio dela trabalhava como operador de máquinas. O seu Alcides nos deixava entrar sem pagar, para isso precisávamos estar bem ates do início da primeira sessão. Nesses momentos eu experimentava a magia de estar do outro lado, atrás daquele quadradinho por onde passava luz e a imagem era projetada na tela. Ali, eu via os rolos de filmes e grandes círculos de ferro que seu Alcides girava. E quando o filme arrebentava, e isso era comum, ele cortava, emendava e seguia adiante. Nunca imaginei que anos depois eu relembraria essas situações no filme Cinema Paradiso, de Giuseppe Tornatore, 1988, mas que assisti somente por volta de 2004, já em casa, em fita vhs, porque cinemas já não existiam mais. Não me recordo em que ano o Guarany fechou, mas ali eu assisti a série de filmes-catástrofes, característicos nos anos 70: Inferno na Torre, Terremoto, Aeroporto, Tubarão, e também o aterrorizante O Exorcista. Lembro que na época o que mais se falava era no vômito verde da guria, o que nos lembrava abacate esmagado com açúcar, o que comíamos com frequência. Foi ali no Guarany que assisti A Estrela Sobe e tive contato pela primeira vez com Esses Moços, de Lupicínio Rodrigues. E foi ali, também, que assisti a ópera rock
 Tommy, com a banda The Who.  Eu gostei tanto que assisti mais de uma vez e comprei o álbum duplo de discos de vinil. Lembro que O Último Tango em Paris não foi exibido no Brasil, só no Uruguai que, aliás, continua sendo "ponta" nas liberações, tanto de filmes, quanto do divórcio e agora da maconha.

O cinema foi fechado, hoje poucos sabem que ali havia um cinema construído pelos moldes internacionais de cinema, em 1939. No seu lugar há um grande supermercado.

Seu Alcides foi passar filmes no céu há muitos anos, minha amiga Isabel não a vejo há um tempão. Lembrei de tudo isso hoje porque reencontrei no facebook dois filhos do seu Alcides, que não me reconheceram. 

Nostalgia, mas alegria por lembrar de uma história que certamente não foi só minha, mas de todos os frequentadores do Cine Guarany naqueles anos de calça boca de sino, reunião dançante na garagem de casa e filmes no escurinho do cinema.

Comentários

Clau disse…
Fantástico, inigualável, sinceramente, não tenho adjetivos suficientes para esta maravilha cinematográfica e filosófica.
Gostaria que todos, antes de viver, vissem Cinema Paradiso e lessem O Deserto dos Tártaros.
Clau.
Clau disse…
Ainda tento me corrigir, modificar e..."lessem" O Deserto dos Tártaros.

Clau

Postagens mais visitadas