Vou de táxi (?)


Quando vou a Porto Alegre gosto de andar a pé,  caminhar pelas ruas, desbravar os labirintos do centro em direção à Cidade Baixa. Prefiro os domingos em que posso observar as fachadas dos prédios, as portas, janelas, sacadinhas, algo impossível em dias ensolarados em que a rua da Praia está repleta, parecendo um mar de gente.
Mas, quando não conhecemos o caminho,e a distância a percorrermos a pé é inviável ou se vamos a uma festa e queremos beber algo além de água mineral, uma alternativa é ir de táxi.  Tem até uma máxima que prega "se beber não dirija". Ou seja, vá (também) de táxi. Não precisamos nos preocupar em garimpar estacionamento nem em fazer um tratado de paz com o flanelinha. Simples, pegamos um táxi.
 Bem, minhas experiências com táxis em Porto Alegre tem sido um tanto bizarras. Mais de uma vez aconteceu de o taxista não conhecer o local onde eu queria ir e mesmo eu dando o endereço ele não sabia como chegar lá. Aí, ele me pergunta...vamos pela rua tal ou pela tal? E eu sei? Mas não digo que não sei, tento ser evasiva pra ele não saber que eu não sei. Mas pergunto aos meus botões, ele não deveria saber chegar lá, com gps e tudo? Tem os que voam, costurando pelo trânsito. Aí, tento colocar o cinto de segurança e não acho o engate...e procuro, enfio os dedos pra dentro do banco e nada. Aí, pergunto...moço, e o cinto? Ah, ninguém usa moça...(ainda bem que não me chama de tia)...e completa, eu também não gosto de usar, mas tenho que usar. Se ele errar a agulha, quero dizer o carro, bate! Ele está de cinto, e eu? Vou voar, com certeza.
 Também tem aquele que peguei na Casa de Cultura Mário Quintana pra ir até o restaurante Oriental. Eu poderia ter ido a pé, é perto, bem perto, mas eu não sabia. O taxista encontrou várias barreiras pelo caminho, várias tranqueiras. Lembrei até do poema do Drummond "tinha uma pedra no meio do caminho, no meio do caminho tinha uma pedra". Passeatas, manifestações, encanamento de água estourado. Depois dos dezessete reais eu disse pra ele...quem sabe o senhor me deixa por aqui, vou indo a pé. E ele, a senhora que sabe, mas é muiiiito longe, vai demorar quase uma hora pra chegar lá...vamos por ali que é mais rápido. E assim foi, demorei  uns quarenta minutos pra chegar e vinte e cinco reais a corrida. Dava pra vir até Estrela!
Tem os conversadores, os que contam a vida, tem aquele que disse que é o mais velho taxista de Porto Alegre, que já tem 81 anos. Isso pode? Esse me contou que nunca bateu, mas uma mulher bateu na traseira do seu carro porque ficou olhando uma vitrine (dirigindo) e não parou. Não sei se foi piada machista dele ou se foi verdade. Tem o taxista com gps, tv, revistas e até água mineral para os clientes. E fala inglês. Desse eu peguei o cartão, mas como tem o ponto no aeroporto é difícil vir até a Cidade Baixa pra me levar para a rodoviária....hehehe
Tem os que contam a vida, a separação, os filhos rebeldes...tem os que são eruditos, tocam piano. Tem os limpos,perfumados, os arrumadinhos, os desarrumados, meio sujos, com cara de bandido. O último que peguei, pra ir do Praia de Belas até a Cidade Baixa estava com a mão direita quebrada, engessada. Ou seja, estava dirigindo só com a mão esquerda, mas conseguia fazer as mudanças de marcha com o polegar direito e até me mostrou como fazia a terceira. Ele logo foi se explicando, que havia quebrado a mão mas precisava trabalhar, pagar as faturas dos cartões. Que no dia anterior havia pago o cartão da C&A, da Renner. Que pagou 100 na Paquetá, um sapato que a mulher comprou. E foi falando, relatando as suas dívidas e suas dores. Que sabia que não podia dirigir com  uma mão só,mas que precisava pagar suas contas e  que de dia escondia a mão para baixo e à noite, mostrava, ninguém o proibiria de dirigir. Que o táxi era dele, que ia trabalhar até a meia noite, etc, etc,etc. A essa altura eu estava torcendo pra ele dirigir com a esquerda e quando tivesse que fazer mudança que seu polegar direito funcionasse.  
 Pegar táxi em Porto Alegre, no inverno, numa sexta feira, depois das 18 horas, é uma verdadeira aventura. E não for nada disso, ainda é uma aventura, não se sabe quem está atrás do volante. Uma coisa é certa, o melhor é sempre concordarmos com eles ou poderemos ter o mesmo fim que o taxista dava aos passageiros naquele filme com o Denzel Washington e a bela Angelina Jolie: o Colecionador de Ossos.


Comentários

Clau. disse…
Em São Paulo, eu pegava táxi todos os dias. A quase totalidade, malufistas. Mas. ainda assim, eram um bom termômetro para dizer quem iria ganhar as eleições, mesmo que não fosse o Maluf.
Mas, a grande tragédia, era pegar um evangélico. Não adiantava dizer que eu tinha bíblia e que lia quase que diariamente. Queriam saber qual era a minha bíblia, queriam saber detalhes, me sugeriam livros, capítulos e versículos, me davam panfletos e era um tal de Senhor para cá, Senhor para lá.
Que o Senhor te livre disto.

Nas minhas viagens a Porto Alegre, fiquei impressionado com a loucura dos motoristas. Andar na Farroupilha dava a sensação de tentativa de suicídio. Creio que deve ter melhorado. Mas na época, era "Fé em Deus e pé na tábua". Cruzes.
Clau disse…
Fiz um comentário que foge ao cerne da questão, ou seja, caminhar pelas ruas a pé, especialmente na Cidade Baixa. E ver, observar, entrever, pensar e imaginar. Não sei o que significa Cidade Baixa, mas, pelo título, parece ser uma parte mais simples ou mais antiga, na qual podem existir várias casas do outro lado da rua, com suas histórias, reais ou imaginárias, seus moradores, ancestrais, enfim, um visual que só funciona caminhando pelas ruas. E a isto, ponho-me a divagar sobre a pressa de motoristas.Bem, apesar da demora, creio ter captado o verdadeiro sentido do texto.

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